É bem comum ouvir professores dos anos finais do Ensino Fundamental e do Ensino Médio afirmarem que seus alunos adolescentes não gostam de ler poesia.
No entanto, parece-me que esta constatação não contempla um olhar atento do mediador de leitura literária para seu público jovem: o modo como os adolescentes se relacionam com a palavra escrita, se dá, em grande parte das vezes, através do poema. É só olhar as últimas folhas de um caderno de adolescente. Em meio a assinaturas estilizadas, coraçõezinhos, encontramos frases soltas que revelam as inquietações amorosas e existenciais do jovem, mas também frases cheias de ironia - um exemplo é o "só que não!" - figura de linguagem bastante utilizada pelos teens. Grande parte do acervo linguístico dos jovens vem da internet, através dos memes, das letras de música, dos poemas apócritos (caso dos supostos poemas de Clarice Lispector e Caio Fernando "de" Abreu).
O que fazer com este repertório de conhecimentos trazidos empiricamente pelo aluno? Primeiro, não se pode desprezá-lo, ainda que a qualidade literária desses textos não seja a desejável pelo professor. Letras de música são uma forma de aproximação do jovem com a poesia, através de gêneros que exploram elementos visuais do poema, como o RAP (a propósito, sua sigla em inglês é Rhythm and Poetry), a MPB e, inclusive, outros menos explorados, como o repente e a trova (formas de improvisação musical). A partir deste estudo, resgatar a origem da poesia, que nasce ligada à música na Grécia Antiga, propõe um diálogo interdisciplinar com Artes e História. A propósito, recomendo o texto do poeta Arnaldo Antunes, "A origem da poesia". A obra poética de Antunes, a de poetas concretistas, como os irmãos Campos e Décio Pignatari, e de contemporâneos, como Alice Ruiz e Ricardo Silvestrin, propõem inúmeros jogo de sentidos com a palavra concreta, muitas vezes, com ironia. Que tal propor jogos de criação com a palavra e expor como uma intervenção poética pelas paredes e corredores da escola?
Tratando de acervo de poesia autoral para jovens, além dos autores indicados acima - aceito sugestões, pois o conhecimento sempre é limitado - indico "Duelo de Batman contra a MTV", de Sérgio Capparelli, que trata do rompimento simbólico que o jovem precisa ter com sua família para que consiga construir sua própria história; "Um pequeno tratado de brinquedos para meninos quietos da cidade", de Selma Maria, que, com muita sensibilidade, traz imagens poéticas que dialogam com a vida urbana; "Autorretrato", de Renata Bueno, cujo projeto literário e gráfico pode possibilitar atividades que proponham um autorreconhecimento deste jovem. Lembro também de dois livros que li com os alunos (não os tenho aqui comigo), mas que conversam bastante com o universo juvenil, "Poeplano", de Dilan Camargo, e "Futurações", de Caio Riter.
Com os poetas "clássicos", a lista é grande e varia muito de acordo com a percepção do mediador de leitura em relação a seus alunos (seus hábitos, gostos pessoais). Dependendo do acervo da biblioteca, ou até mesmo do que está disponível na internet, o interessante é ofertar uma lista de autores para que os próprios alunos façam suas preferências e que sugiram a inserção de novos nomes para a lista. Pela minha experiência, Mario Quintana é o queridinho dos adolescentes - tanto pelo lirismo como pela amargura presentes em seus poemas.
Nenhum comentário:
Postar um comentário